Reflexão sobre a nova Estratégia de Investigação e Inovação (2014-2020)

 

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Sem ter como ambição analisar exaustivamente a evolução da inovação em Portugal na última década, é contudo relevante referir alguns dos principais resultados obtidos.

Portugal assistiu a uma evolução muito significativa da produção científica, do número de doutorados, do índice de especialização científica, por exemplo nas ciências do mar, da Engenharia Alimentar, das Ciências Agrícolas e da Biotecnologia, da interação das entidades do Sistema Cientifico e Tecnológico (SCT) com as empresas, do crescimento do Sistema Nacional de Investigação e Inovação, num quadro de acelerado processo de convergência com a média da EU27, o sustentado aumento da capacidade de inovação das empresas, que muito contribuiu para os excedentes na Balança de Transações Tecnológica e, fator não menos relevante, o reposicionamento da inovação nos discursos e ações no mundo empresarial.

Contudo merece registo a manifesta debilidade do impacto da produção científica portuguesa na economia nacional, em particular a focalizada na produção de bens e serviços transacionáveis no mercado global, a fraqueza da intensidade tecnológica destes bens e serviços, a insuficiente mobilidade dos doutorados, em particular do SCT para as empresas, a predominância dos investimentos na investigação de base e não na investigação aplicada, o inesperado reduzido número de patentes registadas e a, ainda profunda, perceção de que as universidades e as empresas têm muita dificuldades em articular e desenvolver as ações necessárias à concretização do novo paradigma nacional: alavancar o crescimento da nossa economia na inteligência, na criatividade, no conhecimento, na tecnologia e no reforço da inovação das nossas empresas.

Aspeto interessante a analisar e refletir, no contexto da inovação das nossas empresas, é o facto de um número significativo das suas inovações serem novas apenas para a empresa, e não para o mercado.

A União Europeia consciente da debilidade da economia europeia, face á americana, japonesa e, porque não reconhece-lo publicamente, à chinesa exige que cada estado membro estabeleça uma Estratégia de Investigação e Inovação para uma especialização Inteligente, cuja implementação será suportada pelos Fundos Estruturais no período de 2014-2020.

Reconhecendo que o processo de inovação é materializado na transformação da informação e conhecimento disponível, e captado em diversas fontes produtoras, em bens, serviços e processos introduzidos e comercializados no mercado, assume-se também que este processo só é eficaz se os produtores de informação e conhecimento interagirem proactiva e sistematicamente, direta ou através dos veículos e redes de conhecimento, com os utilizadores do conhecimento, sendo para tal exigido um aprofundamento das relações e dinâmicas entre os todos estes atores num quadro de reforço de partilha dos objetivos e dos resultados.

A definição da nova Estratégia de Investigação e Inovação exige, não apenas um diagnóstico, independente e exaustivo, dos obstáculos à inovação, mas também um afastamento dos lobbies que se constituíram e das fronteiras que, artificialmente, alguns construíram para defenderem o seu território.

Efetivamente, todos os estudos revelam que os custos de inovação, em Portugal, são significativamente mais elevados do que a média da EU, que a insuficiência dos capitais próprios das nossas empresas, agravada pela dificuldade de obter financiamento, não facilita o investimento na inovação, que os constrangimentos colocados no acesso aos mercados e a incerteza inerente ao sucesso da inovação, frequentemente consequência das barreiras à entrada em mercados dominados por empresas estabelecidas e pela própria administração púbica nas suas compras e a dificuldade, em particular para as PME, em estabelecer parcerias para desenvolverem projetos de inovação, constituem alguns dos obstáculos, inequivocamente já identificados e aceites, ao crescimento da inovação.

É interessante, e estimulante, salientar que a generalidade dos estudos conclui que o perfil, a motivação e a abertura dos empresários e gestores nacionais é mais inovador do que a média da EU, aliás a % de empresas portuguesas que assumem inovar nos bens e serviços, e nos processos, é maior do que média da EU, reconhecendo-se contudo um perfil de especialização internacional em atividades económicas de baixa ou média/baixa intensidade tecnológica.
Sob o meu ponto de vista a nova Estratégia de Investigação e Inovação, independentemente de outros aspetos a considerar, deve assumir como ator principal o sector empresarial, devendo ser este a liderá-la e a impor as opções e objetivos, no quadro da especialização Inteligente do nosso país, devendo o SCT reorganizar-se e reorientar-se para, dinâmica e continuamente, alavancar, reforçar e robustecer o desenvolvimento das empresas.

Para tal, os doutorados e os investigadores têm de descer ao chão da fábrica, devem comprometer-se com resultados utilizáveis e valorizados, os centros de investigação devem ser geridos, também, por empresários e gestores, os projetos de I&D devem, excetuando os focalizados na investigação de base, incorporar obrigatoriamente a comercialização dos bens e serviços, os docentes do ensino superior devem ser avaliados também pelas atividades que realizam com as empresas, as universidades não devem ser apenas centros da produção do conhecimento, mas também centros de partilha do conhecimento com as empresas, os alunos universitários, desde o 1º. ano devem realizar projetos nas empresas e o SIFIDE deve exigir a presença das entidades do SCT nos projetos de I&D.

O país não permite que Portugal erre nas opções que enquadrar na nova Estratégia de Investigação e Inovação.


Júlio Faceira Guedes
Administrador da XZ Consultores SA

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